Entenda Seus Direitos e Proteja Sua Liberdade

BLOG

Estar bem informado pode ser a diferença entre a liberdade e a prisão. Neste blog, compartilho conhecimentos essenciais sobre direito criminal, dicas práticas e orientações que podem salvar sua vida jurídica.

 

Livramento Condicional: Quando o Benefício Pode Ser Concedido na Execução Penal

Rafaela Nascimento

O livramento condicional é uma forma de extinção progressiva da pena privativa de liberdade. Ele permite que o condenado deixe o cárcere antes do término da pena, desde que cumpra requisitos legais e se comprometa a observar condições impostas pelo juízo da execução. Sua previsão legal encontra-se no artigo 83 do Código Penal e nos artigos 131 a 145 da Lei de Execução Penal (LEP). 

Não se trata de liberdade plena ou definitiva. O apenado entra em um período de prova, durante o qual será fiscalizado quanto ao seu comportamento e ao cumprimento das condições impostas. Caso cometa nova infração penal ou desrespeite as regras determinadas pelo juiz, o benefício pode ser revogado, e o indivíduo retorna ao regime fechado. 

O instituto tem natureza jurídica híbrida: é, ao mesmo tempo, uma medida de política criminal, por estimular a boa conduta no cárcere, e uma ferramenta de ressocialização, ao permitir o retorno gradual do apenado à convivência social. Está ligado ao princípio da individualização da pena e à ideia de progressividade, pilares do sistema penal brasileiro. 

Historicamente, o livramento condicional foi criado como alternativa ao cumprimento integral da pena no cárcere, especialmente quando o condenado demonstra boa conduta carcerária e aptidão para se reintegrar à sociedade. Ainda que seja uma conquista do apenado, a concessão do benefício não é automática: depende de rigorosa análise técnica e jurídica por parte do juízo das execuções. 

Critérios objetivos: tempo de pena e reparação do dano 

Os requisitos objetivos são critérios previamente definidos que permitem ao juiz avaliar se o apenado está legalmente apto a pleitear o livramento. O primeiro deles é que a pena aplicada seja superior a dois anos. Para penas de menor duração, não é possível a concessão do benefício, mesmo com somatório de penas por outros processos. 

O segundo requisito é o cumprimento de fração mínima da pena, variável conforme o histórico do condenado. Para o réu primário condenado por crime comum, exige-se o cumprimento de um terço da pena. Já o reincidente em crime doloso deve cumprir pelo menos metade da pena. No caso de crimes hediondos, tráfico de drogas, tortura ou terrorismo, o requisito é ainda mais rigoroso: o apenado deve ter cumprido dois terços da pena. 

Além disso, é necessário que o apenado tenha reparado o dano causado pela infração penal ou demonstre efetiva impossibilidade de fazê-lo. A jurisprudência tem aceitado justificativas socioeconômicas para a inadimplência, desde que comprovada a incapacidade de pagamento. Caso o condenado comprove que não possui bens, renda ou meios para indenizar a vítima, esse requisito pode ser flexibilizado. 

A análise dos requisitos objetivos é feita com base nos autos da execução penal, nos relatórios carcerários e em eventuais manifestações do Ministério Público e da defesa. Apenas quando esses critérios são satisfeitos é que se passa à avaliação dos elementos subjetivos. 

Critérios subjetivos: conduta carcerária e personalidade 

A boa conduta carcerária é um dos principais requisitos subjetivos para a concessão do livramento condicional. Trata-se de avaliação contínua do comportamento do preso, que deve demonstrar disciplina, respeito às regras do sistema prisional e envolvimento em atividades laborais ou educativas. 

A Lei de Execução Penal exige que o apenado não tenha cometido falta grave nos 12 meses anteriores à data da possível concessão. No entanto, o simples decurso desse prazo não garante o direito. A avaliação é feita de forma global, considerando o histórico completo de cumprimento da pena. 

Outro critério subjetivo relevante é o chamado “mérito” do apenado. O juiz pode exigir demonstração de que o condenado está apto a se sustentar por meios lícitos após a soltura. Em casos de crimes cometidos com violência ou grave ameaça, é possível exigir exame criminológico que avalie a personalidade do apenado, seu grau de arrependimento, vínculos familiares e condições psicossociais. 

A decisão sobre a concessão do benefício é fundamentada e deve observar os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da individualização da pena e da proporcionalidade. O juízo da execução pode indeferir o pedido se entender que o apenado não apresenta condições 

mínimas de convivência social, mesmo que os critérios objetivos tenham sido atingidos. 

Condições impostas e fiscalização durante o livramento 

A concessão do livramento condicional está sempre vinculada ao cumprimento de condições estabelecidas pelo juiz. Entre as mais comuns estão: manter ocupação lícita, comparecer periodicamente em juízo para justificar suas atividades, não mudar de residência sem autorização, não frequentar bares ou locais de risco e recolher-se à residência em horários determinados. 

Essas condições visam garantir que o apenado mantenha comportamento compatível com o convívio social e permita o acompanhamento judicial de sua reintegração. O descumprimento de qualquer dessas condições pode acarretar advertência, modificação das regras ou mesmo revogação do benefício. 

A fiscalização do livramento é exercida pela Vara de Execuções Penais, com o apoio da Central Integrada de Alternativas Penais, dos conselhos da comunidade e dos assistentes sociais e psicólogos. A LEP prevê o acompanhamento sistemático do apenado em liberdade condicional para garantir que o retorno à sociedade ocorra de forma segura. 

O prazo de prova, ou seja, o tempo durante o qual o apenado permanece em livramento condicional, é equivalente ao tempo restante da pena. Ao final desse período, se não houver descumprimento, o juiz declara extinta a punibilidade, encerrando o processo de execução penal. 

Revogação e reincidência: consequências jurídicas 

A revogação do livramento condicional pode ocorrer por duas razões: obrigatória ou facultativa. A revogação obrigatória ocorre quando o apenado comete novo crime doloso durante o período de prova. Nesse caso, a decisão judicial deverá determinar o retorno imediato ao regime fechado, e o tempo de liberdade condicional não será abatido do total da pena. 

A revogação facultativa acontece quando o apenado desrespeita as condições impostas ou comete falta grave, sem que haja necessariamente novo crime. Nessas situações, o juiz pode aplicar medidas alternativas ou manter o livramento com novas condições, a depender da gravidade da infração. 

Em ambos os casos, a revogação do benefício interrompe o processo de reintegração. O tempo em que o condenado esteve em liberdade condicional é desconsiderado para fins de cumprimento de pena, salvo decisão judicial fundamentada em sentido contrário. 

A reincidência após o livramento condicional tem implicações jurídicas relevantes. Além de impedir nova concessão em curto prazo, pode agravar a pena no processo futuro, influenciar o regime inicial de cumprimento e prejudicar a obtenção de outros benefícios. 

Conclusão: entre a legalidade e a reintegração social 

O livramento condicional é um dos mecanismos mais importantes da execução penal brasileira. Ele representa um elo entre a pena privativa de liberdade e o retorno à vida em sociedade, funcionando como instrumento de avaliação e estímulo à ressocialização. Apesar de ser um direito subjetivo do apenado, sua concessão exige critérios rígidos, análise individualizada e constante acompanhamento. 

O instituto também revela os desafios estruturais do sistema prisional. Superlotação, ausência de políticas de reinserção e desigualdade no acesso à Justiça afetam diretamente a efetividade do livramento. Para que o benefício cumpra sua função, é necessário que o Estado ofereça suporte real à reintegração, com políticas públicas que garantam educação, trabalho e assistência social. 

Ao reconhecer o esforço do apenado que demonstra mudança e comprometimento, o livramento condicional contribui para humanizar a execução penal. Não se trata de impunidade, mas de justiça com base na dignidade e na responsabilidade social. 

Referências 

BRASIL. Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. BRASÍLIA, 1984. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm. Acesso em julho de 2025. 

BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Rio de Janeiro, 31 dez. 1940. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm. Acesso em julho de 2025. 

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. CNJ serviço: Livramento condicional. Agência CNJ de Notícias, maio de 2018. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/cnj-servico-livramento-condicional/. Acesso em julho de 2025. 

CONFIRA OS ÚLTIMOS ARTIGOS DO BLOG

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *